setembro 07, 2014

Saudades de Montmartre

Joseph d'Egoût caminhava solitário e cabisbaixo tinha entre os lábios um bom charuto; um Cohiba. As mãos enfiadas nos bolsos da calça de linho e sobre a cabeça um Fedora levemente inclinado. Ao longe latidos esporádicos rasgavam o silêncio daquela noite; fria noite de agosto.

Os paralelepípedos ladeados por sobrados coloridos e apertados entre si, atados por varais vazios iam deslizando por sobre seus ombros para trás ficando, lenta e melancolicamente a cada passo. O último ônibus há muito passou. Tudo ou quase tudo é silêncio: as pessoas dormem e os cães ladram.

A noite que agora apresenta-se pertence aos excêntricos, aos artistas às prostitutas amadas e amantes de homens e de mulheres; amantes das madrugadas.

Em seu caminhar Joseph d'Egoût recorda-se de madrugadas idas, memoráveis por ele vividas em Monmartre antro boêmio que alimentava-se de poesias e de seus poetas, de aristocratas e desempregados de artistas, intelectuais, viciados, mas, fundamentalmente, alimentavam-se de homens e de almas.

Os musicais cheios de luzes, paralelos à luxúria e à prostituição foi nesse ambiente que viveu o nascimento de novos movimentos artísticos, de artistas como Toulouse-Lautrec que um dia mapeou e expos a alma dessas noites. As saudades de Monmartre corroíam-no, especificamente o número 82 da Boulevard de Clichy, endereço do Moulin Rouge que abraçava a tudo e a todos, fossem ou não ébrios, viciados ou artistas. Ah! o Moulin Rouge!!! Suspira Joseph d'Egoût. Bons tempos. Tempos idos, jamais olvidos.

Uma vez em terras americanas Joseph d'Egoût desfrutava as noites, mas essas noites eram de uma calmaria tamanha que quase sufocavam-no. O início da década de 40 mostrava-se por demais turbulenta, principalmente do outro lado do Atlântico onde a vida em sua Cidade Luz fora usurpada e no dia 14 de julho de 1940 quando a Wehrmacht entra com seus arianos jactantes a marchar sob o Arco do Triunfo, desvirginando o moral parisiense deixava claro: A Champs-Élysées nunca mais será a mesma. Não haveria mais poesia no ar e, sim bombardeios – o armistício fora instaurado -. Sua Paris exporia nos anos seguintes os esqueletos de suas edificações; cadáveres da alegria. Joseph d'Egoût no entanto estava entre os mais de dois milhões de parisienses que rapidamente deixaram a cidade.

A noite é fria e a paz é relativa para Joseph d'Egoût. Ele carrega um coração puído apequenado pelas saudades de sua maltratada e vilipendiada Paris. Num suspiro seus lábios sussurram apenas para seus ouvidos:


- Um dia eu volto pátria amada. Quiçá apenas minha alma, já que essa carcaça ... dificilmente!

Elcio